Até para fazer boa ação eu sou ruim

Daí que ontem toquei pro Mundo Verde, como diz o índio do comercial, afinal de contas a linhaça de cada dia precisa estar lá no suco de couve. Não perguntem, mas esse negócio de 105 quilos é sério e tal.

Pois bem, na porta do Mundo Verde estava um mendigo. Cada um que passava era parado pelo mesmo motivo de sempre: dinheiro para a fome, para a cachaça, para o que quer lá que seja. Lícito ou ilícito, inclusive. Estava sem nada no bolso, só com o dinheiro de plástico e como o mendigo não era Feliciano e eu não era trouxa, não dei cartão e senha.

Pedi aquela desculpa marota e dentro da loja caía em mim o peso do mundo em remorso. Porra né Julio, o que custa, o cara está com uma fome daquelas de comer rabada achando que o mundo é uma maravilha. Colabora lá, velho, faz essa boa ação e quem sabe daqui alguns anos a Lei do Retorno te dê uma Mega-Sena pelo conjunto da obra.

No mesmo instante me bateu que, vejam só, estava numa loja de produtos naturais. Imagina que você é um mendigo, que sua fome por arroz, feijão, carne, batata, proteínas e carboidratos aos montes, a ponto de serem jogados para o ar numa cornucópia fodida de sabores e foda-se ao peso sem fim, um vórtex das coisas mais belas do mundo empilhadas num prato como se fossem um Everest e você escalando a parada com uma colher – garfo e faca uma porra – o homem vencendo a natureza e voltando a sua natureza mais primitiva ou um desses papinhos filosófico-chatos que caiba por aqui. Sério mesmo que você vai dar uma barrinha de cereal para o cara que está a ponto de parar na porta de um mercado natural para pedir? Se houver um Hitler, um Stalin, um John Lennon do século 21, você será pior que esse cara, teu nome e dos teus descentes será dito nas piores rodas como a Academia Brasileira das Letras e essas merdas todas.

Depois de muito pensar, saí do Mundo Verde com um pacote de linhaça e três biscoitos integrais de chocolate. Ninguém falou um “a”, mas eu ouvi a meio palmo xingando por telepatia:

– FILHO DA PUTA!

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